Será que o amante perfeito existe?

será que o amante perfeito existe?

Sobre o tema podemos filosofar, ou olhá-lo sob o prisma de teorias sociais e do comportamento. Podemos ainda recorrer à arte e às suas, tantas vezes, inatingíveis musas, tomar apenas como exemplo os neuróticos guiões de Woody Allen, ou simplesmente servir-nos de bom senso ou ainda prestar mais atenção à nossa própria experiência e intuição. Seja qual for a abordagem, a resposta não será una nem universal, pois isso implicaria ausência de mudança e nós próprios mudamos a todo o instante. 

Um pouco de filosofia e outro tanto de cinema 

Partindo do princípio de que a perfeição não existe, que ela não é mais do que um estado de harmonia entre elementos num dado momento e que essa avaliação ou validação depende mais dos olhos de quem vê do que das coisas em si, então, o amante perfeito não existe. Da mesma forma que se pode dizer que o marido ou relação perfeita não existem. Se a perfeição existisse, os casamentos poderiam atingir esse patamar absoluto e nem sequer haveria amantes, ou necessidade deles, apenas amores.

Afirmações ainda mais fáceis de proferir quando em mãos temos a volátil, complexa e inconstante massa humana, todos os seus caprichos e vicissitudes. Felizmente não vivemos em teoria, mas no mundo prático e real e todos já nos sentimos imensamente perfeitos e realizados ao lado de alguém. Por haver ainda espaço para a psicologia, e sabendo que ninguém é isento de defeitos, concluímos facilmente que esses momentos de perfeição são construções pessoais que nascem de necessidades e sentimentos momentâneos. Caminhamos já para terreno mais otimista e satisfatório, mais apto a encontrar o mítico amante perfeito, aquele que o cinema nos vende desde sempre, por saber como somos sonhadores e insatisfeitos. 

Dar a volta à questão 

Dando a volta ao texto e à questão, a pergunta que deveríamos fazer é se um amante pode ser perfeito. Aí, sim, estamos a chegar mais perto do conforto emocional, ou meramente físico, que a busca de um amante exige ou, pelo menos, pressupõe. 

No universo dos casados, o amante perfeito começou por ser a pessoa com quem alguém se predispôs a viver e perfeita foi a disponibilidade para aceitar e normalizar as diferenças ou imperfeições de cada um, em nome de um contexto mais abrangente de entendimento, paixão e afetividade. As rotinas, a família, as exigências profissionais e o desgaste normal em qualquer coexistência começam depois a impor mais atrito num caminho que se imaginava ‘perfeito’ e harmonioso e, um dia, a perfeição surge com toda a sua ‘irrealidade’. Parte-se, então, em busca de nova ‘perfeição’. Uma mais breve e fragmentada ou à qual não impomos, desde logo, tantas exigências. Um amante, alguém ao lado de quem podemos voltar a imaginar a ausência de falhas ou, mais simplesmente, alguém que pode ter falhas. 

Nessa perspetiva, o amante será sempre alguém mais perfeito do que o parceiro primário, já que o amante é alguém a quem não se exige tanto, alguém com quem não se partilham aflições, contas e preocupações. Alguém que não traz bagagem, com quem caminhamos apenas intermitentemente e cujas imperfeições são invisíveis ou desvalorizadas nos breves momentos que se partilham e nos quais ambos estão apostados no prazer e no bem-estar comuns. 

O amante perfeito 

O amante perfeito é aquele que em determinado momento oferece exatamente aquilo de que se necessita. Aventura, prazer, ligeireza, despreocupação, um escapa às imperfeições da vida, 

do casamento e às nossas próprias imperfeições. Porque a perfeição também é a capacidade de nos permitirmos ser felizes, ainda que por linhas enviesadas, que nem sequer contemplávamos em determinada altura da vida. Por essa razão, inúmeras pessoas casadas procuram amantes no Second Love. Reconhecem, por um lado, que o seu casamento não é perfeito, mas entendem, por outro, que o amor que os mantém nesse compromisso é real e não pode ser descartado. Apostando em necessidades reais, físicas e sexuais, ou afetivas e emocionais, fazem uso de uma saudável racionalidade e procuram aquilo que impede a sua total realização sexual ou pessoal num outro parceiro, ao invés de pôr fim a um casamento, que, um dia, já foi ‘perfeito’, podendo mesmo voltar a sê-lo. 

Os finais felizes estão sobrevalorizados 

Por ser novidade, um amante é fresco e atraente, alguém em quem qualquer defeito é apenas uma mania ou característica, a qual não temos de levar para casa e com ela conviver a toda a hora. Assim, é mais fácil encontrar um amante perfeito do que uma pessoa perfeita. Os amantes são indivíduos que se encontram em momentos similares, com carências que ambos entendem, e que buscam peças-chave específicas, alguns episódios em falta no guião das suas vidas, e não toda uma nova e imaculada narrativa. Também já não trazem o vão e inocente desejo de encontrar príncipes encantados e donzelas prendadas, estereótipos gastos pelo cinema e desfasados da realidade. Os amantes procuram inúmeras coisas, mas nenhuma 

delas é a perfeição. Talvez por isso mesmo, por não pensarem nela, seja mais fácil ficar perto de sentimentos de plena felicidade, numa relação descomprometida, que se cumpre a cada encontro, sem necessidade de prequelas ou sequelas, sem julgamentos ou exigências. Porque o prazer é apenas real e não aspira à perfeição é mais facilmente capaz de se mascarar de coisa perfeita e sem mácula. E ainda que essa ‘perfeição’ tenha existido num mero segundo, então, ela existe e esse foi um segundo perfeito. 

Em vez que procurar perfeição em pessoas e relacionamentos, no lugar de almejar um pleno e irrepreensível final feliz – demasiadamente sobrevalorizado –, porque não apostar em ‘intervalos’ felizes? Em episódios descomprometidos e aprazíveis, sem o peso de planos imortais e sem aspirar a obras de arte? Não vivemos em museus, e a felicidade pinta-se de muitas cores. Descubra as suas. 

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